Partindo do pressuposto de que a leitura dos espaços urbanos, periféricos e centrais, não se faz somente sobre mapas, construindo um código abstrato, mas que essa leitura é por excelência “sintomal”
[1], colocamo-nos em busca do que apresenta e de seus significados. Primeiramente cabe refletirmos sobre como as periferias urbanas se mostram, quais suas configurações, em seguida, o que são, o que revelam e por que.
Ao caminhar por periferias de Porto Velho, Itapecerica da Serra e São Paulo, com um olhar mais atento do que costumo ter em meu cotidiano de travessias na cidade – onde faço também o caminho centro-periferia, periferia-centro -, foi possível notar que estas se mostram afastadas dos centros de decisões da cidade e apresentam infra-estrutura precária. As moradias, na maioria das vezes são contíguas umas às outras, pouco espaçosas e inacabadas. Algumas parecem ser inseguras, incapazes de resistir a alterações climáticas as mais previsíveis, como chuvas fortes. Telefones públicos, pavimentação, saneamento básico, escolas, postos de saúde, quando existem nesses “bairros”, não funcionam de modo satisfatório. É comum nos depararmos nesses lugares com telefones que não fazem ligação, pavimentação insuficiente, saneamento básico inexistente, escolas que não ensinam, postos de saúde que não curam e não previnem.
Periferia é uma categoria de matriz geográfica que costuma ser pensada na dialética da cidade: centro/periferia, capital/trabalho. A classe de menor poder econômico ao ver-se impossibilitada de adquirir uma residência nos bairros centrais ou a ele adjacentes, e mesmo de pagar o alto preço dos aluguéis muda-se para regiões distantes. Na maioria das vezes trata-se de áreas de risco, na encosta de morros ou junto a córregos, distante do local de trabalho e da infra-estrutura adequada a uma vida com qualidade. Distante das boas escolas, dos bons hospitais, dos espaços de lazer.
São nessas regiões afastadas do núcleo de concentração do capital, dos serviços e do “lazer sofisticado” que os bairros dos pobres são construídos, diferente do que acontece, por exemplo, nas periferias da Europa e dos Estados Unidos, onde esses bairros são denominados “subúrbio”. Lá as áreas periféricas são as preferidas da classe média e alta e as centrais tornam-se habitadas pelos pobres e minorias étnicas. Nos dois casos percebemos uma segregação social manifesta no distanciamento em nível territorial.
Como o capital é móvel, hoje em dia já não se pode falar de uma única centralidade
[2] e conseqüentemente, de uma única periferia. Percebemos, inclusive, o crescente interesse do capital se direcionando para as áreas periféricas, onde terrenos são adquiridos e permanecem inutilizados até sua “valorização”. Atualmente notamos condomínios de luxo erigidos na periferia, contudo, estes se relacionam o mínimo possível com o seu entorno, porque foram construídos para ser uma espécie de “ilha auto-suficiente”, com segurança própria, academia de ginástica, salão de beleza, cinema, creche, cursos de idiomas. E o que vier a faltar pode ser pedido por telefone ou via Internet. Caldeira os caracterizou como “enclaves fortificados”.
[3]Apesar de se localizarem em zona periférica, esses novos residenciais se diferenciam da vida que o circunda por sua estrutura e nomes elegantes. Jamais assume o nome do bairro, o signo da “quebrada”. É sempre o “jardim”, o “parque”, o “paraíso ecológico ou tropical” a “menos de X minutos” dos melhores restaurantes, aeroportos, bancos e escritórios. Contudo, esta não é a paisagem dominante nas periferias. O que mais se vê são casas inacabadas, sustentadas pela parede do vizinho ou pela encosta do morro, campinhos de futebol e singelos templos evangélicos. Edificações que de tanta dificuldade para serem feitas, já nascem com semblante de velhas. De acordo com José Moura Gonçalves Filho,
A visão dos bairros pobres parece, às vezes, ainda mais impiedosa do que a visão de ambientes arruinados: não são bairros que o tempo veio corroer ou as guerras vieram abalar, são bairros que mal puderam nascer para o tempo e para a história. Um bairro proletário não é feito de ruínas. Ocorre que ali o trabalho humano sobre a natureza e sobre a cidade parece interceptado [...] No bairro pobre, menos de ruína, o espetáculo mais parece feito de interrupção –, as linhas e as formas estão incompletas, não puderam se perfazer. Os meios, os recursos, sobre os quais o homo faber investe o seu poder inventivo, foram perdidos ou nunca foram alcançados: o resultado destas carências e frustrações é que os poderes mesmos da fabricação humana ficam perdidos ou nunca são alcançados – lançam-se em situações sem suporte, gastam-se no ar, sem resposta, são neutralizados. Faltam os instrumentos, faltam os materiais que suportariam o trabalho humano para a configuração de um mundo, para a fisionomia de uma cultura. Gradualmente, chega a faltar o animus faber
[4].
Tudo é difícil para o habitante da periferia: o deslocamento para o trabalho ou para o desfrute de um momento de descanso, o pagamento do aluguel e dos encargos públicos, a construção da casa própria, as humilhações e preconceitos vivenciados no dia-a-dia. Como resistência a esse processo que os aparta tanto da esfera pública quanto da esfera privada
[5] e na tentativa de se manterem minimamente integrados (trabalhando, consumindo), criam espaços de sociabilidades específicas: a casa sempre em construção, o campo de futebol, o bar onde o grupo de pagode do bairro pode falar do amor e suas decepções, a festa onde os meninos MCs daquela e de outras periferia podem encontrar receptores para seus protestos.
A periferia é um espaço que só será bem compreendido se levado em conta as relações sociais e expressões culturais que apresenta, e para isso, é preciso mais do que um olhar absorto em seus caracteres “exóticos” e em sua “capacidade de adaptação à realidade”. É necessário compreender os limites dessa segregação social, bem como seus vínculos com a regressão nos investimentos públicos e a gestão discriminatória da regulação e uso do solo. Outro fator que é preciso considerar nesse processo produtor de segregação social e espacial, é a urbanização. Esta, de acordo com Milton Santos
[6] ganhou destaque no Brasil a partir de meados do século XX, com alterações na base de nossa economia: incentivo à industrialização e declínio da produção agro-exportadora de café. Urbanização e industrialização caminhavam lado a lado e pareciam representar uma porta de saída para a independência de séculos de dominação da produção agrária, todavia, “a evolução dos acontecimentos mostrou que ao lado de intenso crescimento econômico (7% em média entre 1940 e 1980), o processo de urbanização acarretou em crescimento da desigualdade e em uma gigantesca concentração espacial da pobreza”
[7].
Trabalhos como o do geógrafo Milton Santos
[8] e dos arquitetos Nestor Goulart Reis Filho
[9], João Sette Whitaker Ferreira
[10] e Ermínia Maricato
[11] apontam para as especificidades da urbanização do Brasil no século XX. Se por um ângulo esse fenômeno é visto positivamente, como necessário para o crescimento do país, já que apto a atrair investimentos e gerar “oportunidades de emprego”, por outro é considerado responsável pelo acirramento das desigualdades sócio-econômicas, das disparidades entre as regiões e as habitações de ricos e pobres, pelo aumento das periferias.
O crescimento da periferia no Brasil é sintomático de uma urbanização desigual, cujas intervenções estéticas são realizadas majoritariamente em áreas de grande visibilidade, concentração do capital e interesses do Estado. De acordo com Eunice Maria Durham,
A população pobre está em toda a parte nas grandes cidades. Habita cortiços e casas de cômodos, apropria-se das zonas deterioradas e subsiste como enclaves nos interstícios dos bairros mais ricos. Mas há um lugar onde se concentra, um espaço que lhe é próprio e onde se constitui a expressão mais clara de seu modo de vida. É a chamada periferia [...] formada pelos bairros mais distantes, mais pobres, menos servidos por transporte e serviços públicos.
[12]Essa população pobre, ao se deslocar de seus estados de origem em busca de trabalho e melhores condições de vida, levava consigo o sonho da casa própria, que se tornou uma aspiração coletiva da classe trabalhadora. Kowarick
[13] mostra que, até os anos 30, as empresas resolviam parcialmente o problema habitacional dos trabalhadores por meio da construção de vilas operárias. Isso era viável na medida em que a quantidade de força de trabalho a ser alojada ainda era pequena, mas com a intensificação do processo de industrialização, o número de trabalhadores aumentou, bem como a pressão sobre a oferta de habitações populares. Diante disso, as empresas transferiram para o Estado o dever de fornecer moradia aos trabalhadores, as vilas operárias tenderam a desaparecer e a questão da moradia passou a ser resolvida pelas relações econômicas no mercado imobiliário.
Na impossibilidade de comprar ou alugar uma casa nas áreas nobres da cidade, e na falta de financiamentos e alvarás para a construção - concedidos apenas a terrenos legalmente documentados foi preciso que as famílias trabalhadoras construíssem suas moradias nos bairros distantes e com sérios problemas infra-estruturais. Como as condições econômicas não são favoráveis a essa classe, o trabalho de construção das casas pode levar anos para ser concluído. Mas esta não é a única face da segregação, ela ainda se mostra em seu perfil social: essas pessoas apartadas geograficamente do resto da cidade também têm distantes suas condições de acesso a cidadania. Entendemos que a cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro de seu grupo social
[14].
Entendemos que as famílias colaboradoras deste estudo, assim como os demais habitantes das periferias urbanas, estão em busca da cidadania. Os lugares que habitam: casas, apartamentos ou barracos de ocupações de trabalhadores sem-teto estão postos em periferias urbanas, são desses lugares que eles falam, que partilham conosco suas experiências e ideais de cidade. Isto nos levou a pensar a periferia “no contraponto entre estar fora e estar dentro da cidade”. De acordo com Rodrigues e Brito, “normalmente, a periferia é pensada como a borda, o limite entre o fora e o dentro. Estar na periferia é estar distante, na coincidência entre a distância espacialmente considerada e a distância politicamente imposta. É estar fora do centro do poder de decisão”
[15]. Os bairros pobres que se formam a cada dia, as ocupações do MTST e do Movimento dos Trabalhadores Sem-teto de Rondônia, ao mesmo tempo em que constituem a condição primordial para que essas famílias se incluam na vida urbana da sociedade, são, em muitos casos, a única maneira de estar na cidade. Esse “estar na cidade”, como vimos, é contraditório: significa situar-se em seu espaço, mas não fazer parte dela, ser o seu refugo.
Bauman analisou o fenômeno do refugamento humano no âmbito da modernização destacando a questão do trabalho na contemporaneidade. Nosso tempo reflete uma modernização que progrediu triunfante, alcançando as partes mais remotas do planeta. A quase totalidade da produção e do consumo se tornou mediada pelo dinheiro e pelo mercado, a mercantilização e monetarização dos modos de subsistência penetraram os recantos mais longínquos, por isso, não se dispõe mais de soluções globais para problemas produzidos localmente, tampouco de escoadouros globais para excessos locais
[16]. A vitória global da modernização tem como um de seus aspectos o número alarmante de refugo. A produção e o consumo excessivos, os resíduos a serem eliminados, o desperdício e o desejo insano de consumir o novo (que amanhã já será obsoleto), têm acarretado em uma sensibilidade desatenta e descompromissada com o próximo e com a vida na Terra.
Se num primeiro estágio a Modernidade produziu “exército de reserva”, desempregados com a expectativa de logo retomarem seus postos no mundo do trabalho, esse segundo estágio produz pessoas refugadas, colocadas na condição de excesso, de redundância, sem grandes convicções e oportunidades de se re-inserirem na sociedade. Elas estão presentes, mas como lixo, como seres descartáveis que já não tem utilidade. Bauman refere-se a essas pessoas como “vidas desperdiçadas”, de fato o são, pois não estão livres para desenvolver suas potencialidades, mas mais do que isso, diria que são “vidas sacrificadas”, pois é sobre elas que se sustenta o bem-estar dos que se beneficiam do progresso econômico e das vantagens de ser in.
Às pessoas refugadas ou em vias de entrar nesse processo, restam três alternativas: resignar-se, deixando as coisas seguirem seu fluxo, buscar individualmente soluções para os problemas que as atingem, e que como sabemos, não são individuais, mas de ordem social, ou buscar coletivamente a solução. Ao que parece, a última alternativa é a que pode produzir mais efeitos positivos, já que a ação coletiva pressupõe uma vida em comunidade, ou pelo menos um conhecimento acerca desta, memória e princípios partilhados. Aí já não se está sozinho e as forças se multiplicam, visto que “ser abatido como ‘baixa colateral’ do progresso econômico, agora nas mãos de forças globais livremente flutuantes, não é uma sina que os governos dos Estados possam prometer afugentar com alguma fidedignidade”
[17] Se o Estado não pode assegurar os direitos sociais, sobra apenas um caminho: o de construção de uma democracia, no sentido etimológico do termo, e tal ação não pode prescindir de uma reconstrução dos direitos humanos.
Piovesan ensina que:
“No momento em que os seres humanos se tornam supérfluos e descartáveis, no momento em que vige a lógica da destruição, em que cruelmente se abole o valor da pessoa humana, torna-se necessária a reconstrução dos direitos humanos, como paradigma ético capaz de restaurar a lógica do razoável.
Contemporaneamente, é preciso destacar que centros e periferias se movem. No caso de São Paulo, por exemplo, observamos um retorno dos menos afortunados ao seu centro histórico - o que demonstra a circulação do capital e a fluidez dos interesses imobiliários que dia-a-dia estabelecem novas periferias. Desse modo, compreendemos a periferia para além de seu sentido geográfico, ou seja, de um afastamento em relação ao centro, como um processo constante de exclusão/luta por integração na cidade, marcado territorialmente. Vivendo essa exclusão, as colaboradoras deste estudo têm elaborado estratégias tanto para a sobrevivência cotidiana quanto para a transformação da estrutura social, como pudemos ver nas histórias de vida aqui registradas.
Se a crise urbana que presenciamos hoje tem raízes em processos antigos como o da industrialização e modernização nacional, e no próprio desenvolvimento do capitalismo na América Latina, como salientou Kowarick
[18], nos perguntamos: o que mudou? O que há de novo nisso tudo? Os fatores que assinalam a crise urbana já estavam presentes em períodos anteriores, mas neles podiam ser “escamoteados através de uma pseudoliberdade de integração à sociedade de consumo”
[19]. A diferença encontra-se justamente no agravamento desses problemas, à medida que aumentam o desemprego e a queda do valor do salário. A esperança e a luta por transformar esses quadros subsistem, mas já não se tem a convicção de que se trata de uma crise passageira, de que logo ela vai passar e todos terão um lugar na cidade.
No encalço das contradições que se avolumam no espaço urbano, novos Movimentos Sociais têm aparecido e articulado ações contra as políticas deteriorantes dos padrões de vida na cidade. A deterioração desses padrões de vida - que nunca foram lá muito elevados para a classe trabalhadora, para os escravos, os imigrantes, e os trabalhadores assalariados -, tem se tornado mais intenso à medida que o Estado posiciona-se favoravelmente ao grande capital, fornecendo a infra-estrutura e os insumos necessários para que ele possa multiplicar seus excedentes, em detrimento das demandas populares. O resultado dessa parceria entre Estado e capital é o aumento da espoliação urbana, a queda dos salários e do poder de compra e a precariedade ou falta de bens de uso coletivo, como escolas e meios de transporte. A existência desses problemas, não é por si só, suficiente para criar Movimentos Sociais - se fosse assim todos os que tomam ônibus e trens lotados ou não possuem casa própria estariam participando de algum -, mas a tomada de consciência desses problemas e a crença de que “um outro mundo é possível” é deflagrador do projeto de mudança que esses movimentos ensejam.
A periferia, para os militantes desses Movimentos Sociais tem um caráter especial, de transformação da sociedade, de luta e significa comunidade. Marcos narra:
Domingo passado um cara falou: “O time da favela ta jogando bem!” Eu falei: “Time da favela, não! Comunidade João Cândido! Não é favela, a gente já luta para acabar com favela, não vou aceitar essa palavra! É Comunidade João Cândido, Periferia, que é diferente!” Prefiro estar aqui dentro e ver a vida de cada um do que estar dentro do meu carro ou do meu apartamento isolado, com medo de sair na rua, porque os presos hoje são as classes média e rica, que ficam trancadas em suas casas, em seus condomínios, com medo de sair para comprar um pão, comprar crédito para o celular, nós não!
Produção e Apropriação do Espaço Urbano
Dentre os sujeitos produtores do espaço urbano, se destacam as famílias em busca de moradia, os detentores dos meios de produção, os agentes imobiliários e o Estado. No espaço urbano estão presentes camadas de vários tempos, do passado, do presente, do futuro que se deseja construir... Virtualidades, crenças que se cristalizam nos objetos geográficos e arquitetônicos com os quais nos relacionamos e que trazem consigo indícios de ideais, concepções estéticas e políticas, lutas de classes.
Ao produzi-lo, seus construtores projetam nele seu sistema de crenças. De acordo com Milton Santos os construtores do espaço não se desembaraçam da ideologia dominante quando concebem uma casa, uma estrada, um bairro, uma cidade. O ato de construir está submetido a regras que procuram nos modelos de produção e nas relações de classe suas possibilidades atuais.
[20].
Com o avanço do capitalismo o urbano tem passado por inúmeras transformações, a saber:
a) De pequenas, algumas cidades tornaram-se metrópoles densamente povoadas e populosas, que não conseguem atender as demandas dessa população crescente. Essa situação é reflexo, dentre outras coisas, do êxodo rural, também provocado pelo avanço do capitalismo sobre as zonas rurais. Novas tecnologias passaram a substituir em grande parte a mão-de-obra camponesa e mostram-se mais adequadas aos novos interesses mercantis (produção em larga escala, monocultura).
b) A cidade passou a ser mercadoria e seu solo, objeto de especulação imobiliária. Além de grande número de terrenos urbanos ficarem ociosos, aguardando valorização, os que estão disponíveis para comercialização tornam-se tão caros a ponto de serem inacessíveis a determinados segmentos da classe trabalhadora.
c) Com o encarecimento do solo e a gentryfication de determinadas áreas, as classes populares são obrigadas a se deslocar para as periferias, frequentemente lugares distantes do centro da cidade (ou dos centros), distantes de seus locais de trabalho e com sérios problemas infra-estruturais. Enquanto as classes populares são expulsas das áreas centrais e nobres da cidade, as classes média e alta se deslocam também para regiões distantes e constroem nelas “enclaves fortificados”
[21], como condomínios fechados de luxo, que contam com excelente infra-estrutura (alguns já possuem até escola) e considerável rede de serviços, como academias de ginástica, salões de beleza, clínicas de estética e lojas de conveniências.
d) Mas não foi só o solo urbano que se tornou mercadoria. A cidade como um todo passou a ser tratada como tal. A substituição do valor de uso pelo de troca atribuiu à ela novo sentido: ela não é mais considerada lugar para se habitar, mas um “ambiente visual”. Segundo Barbosa
[22] é nessa direção que se investe e se revestem as cidades com design clean do mobiliário urbano destinado a modernizar/disciplinar o uso mercantil da paisagem, por meio de concessão de espaços públicos a corporações privadas. Prefeituras de diversas cidades passam, então, a recortar áreas da cidade e ceder aos interesses das firmas de design urbano, e como contrapartida da criação, instalação e manutenção dos objetos criados, as empresas podem fazer uso do “espaço” para fins publicitários. Assim, sob o primado da circulação de imagens, a cidade é convertida em um capital móvel do consumo seletivo e de massa.
e) A segregação social resultante do processo de comercialização da cidade – separação entre os que podem consumir em demasia, os que consomem apenas o mínimo vital e os que consomem apenas as sobras dos outros, tornando-se eles próprios refugo humano – potencializa a cidade enquanto palco da luta de Movimentos Sociais que visam superar as contradições, desigualdades e prejuízos causados pelo Capitalismo, enquanto modo de produção dominante.
[1] LEFEBVRE, op.cit., p.85.
[2] A esse respeito ver o livro de Heitor Frúgoli Junior: CENTRALIADE EM SÃO PAULO: TRAJETÓRIOS CONFLITOS E NEGOCIAÇÕES NA METRÓPOLE. São Paulo: EDUSP, 2000.
[3] CALDEIRA, Teresa. CIDADE DE MUROS. São Paulo: Ed. 34/EDUSP, 2000.
[4]GONÇALVES FILHO, José Moura. HUMILHAÇÃO SOCIAL: UM PROBLEMA POLÍTICO EM PSICOLOGIA. São Paulo: Psicologia USP, vol. 9, nº 2, 1998.
[5] Esses sujeitos são apartados dos espaços de decisão política e da vivência da intimidade. Passam a maior parte do tempo no trabalho, realizando tarefas alienantes, ou em trânsito entre o local de residência e o do emprego.
[6] SANTOS, Milton. A URBANIZAÇÃO BRASILEIRA. SÃO PAULO: EDUSP, 2005.
[7] MARICATO, Ermínia. A BOMBA RELÓGIO DAS CIDADES BRASILEIRAS. In: (URL: http://www.usp.br/fau/depprojeto/labhab/04textos/exclusao.doc)
[8] SANTOS, Milton. O ESPAÇO DO CIDADÃO. São Paulo: EDUSP, 2007.
[9] REIS FILHO, Nestor Goulart. NOTAS SOBRE URBANIZAÇÃO DISPERSA E NOVAS FORMAS DE TECIDO URBANO. São Paulo: Via das Artes, 2006.
__________ (org.) BRASIL: ESTUDOS SOBRE DISPERSÃO URNANA. São Paulo: FAU-USP, 2007, vol. 1.
[10] FERREIRA, João Sette Whitaker. GLOBALIZAÇÃO E URBANIZAÇÃO SUBDESENVOLVIDA. São Paulo: Rev. São Paulo em Perspectiva, vol. 14, nº 04, 2000.
[10] MARICATO, Ermínia. URBANIZAÇÃO NO BRASIL: A MODERNIZAÇÃO EXCLUDENTE. São Paulo: Família Cristã, vol. 3, 2001
__________ URBANISMO NA PERIFERIA DO MUNDO GLOBALIZADO: METRÓPOLES BRASILEIRAS. São Paulo: Rev. São Paulo em Perspectiva, vol. 14, nº 04, p. 21-33, 2000.
[11] DURHAM, Maria Eunice. A SOCIEDADE VISTA DA PERIFERIA. In: (URL: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_01/rbcs01_07.htm).
[11] KOWARICK, Lucio. A ESPOLIAÇÃO URBANA. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
[12]DURHAM, Maria Eunice. A SOCIEDADE VISTA DA PERIFERIA. In: (URL: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_01/rbcs01_07.htm).
[13] KOWARICK, Lucio. A ESPOLIAÇÃO URBANA. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
[14] DALLARI, Dalmo de Abreu. DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA. São Paulo: Ed. Moderna, 1998.
[15] RODRIGUES; BRITO. Op.cit., p.52.
[16] BAUMAN, op.cit., p.13.
[17] BAUMAN, op.cit., p.112.
[18] KOWARICK, op.cit.
[19] BLAY, op.cit., p.16.
[20] SANTOS, Milton. op.cit., p. 24.
[21] CALDEIRA, op.cit.
[22] BARBOSA, Jorge Luis. A CIDADE CAÓTICA: IDEOLOGIA E SIMULAÇÃO DA CRISE A SOCIEDADE URBANA. In: GEOUSP Espaço e Tempo, 2001, nº 10.